Enquanto a equipe
econômica da presidente Dilma Rousseff pedia aval do Congresso ao pacote
fiscal, uma isenção tributária a igrejas foi incluída na surdina em uma MP
(medida provisória) aprovada no fim de maio.
O benefício pode
garantir a anulação de autuações fiscais a igrejas que extrapolam R$ 300
milhões. O artigo foi
incluído na MP 668, que tratava originalmente do aumento de impostos sobre
produtos importados. Para vigorar, precisa ainda passar pela sanção de Dilma.
Esse
"jabuti" –nome dado a temas estranhos inseridos em MPs– aumenta a
isenção fiscal de profissionais da fé, ao livrar da cobrança de impostos as
chamadas "comissões" que líderes religiosos ganham por arrebanhar
fieis ou recolher mais dízimos.
A medida
beneficia sobretudo as evangélicas neopentecostais, vertente em que o pagamento
de comissões a pastores é mais comum. A Constituição
garante imunidade tributária a templos. Já os profissionais que neles trabalham
e que recebem salário, como pastores, pagam contribuição previdenciária e
Imposto de Renda sobre a remuneração.
Mas não há
tributação sobre ajudas de custo –moradia, transporte e formação educacional,
entre outros itens, desde que esse dinheiro seja para subsistência do
profissional.
Muitos dos casos
de sonegação religiosa são de pastores que recebem, por exemplo, um salário
mínimo e, por fora, "comissões", a título de "ajuda de
custo", que chegam à casa dos R$ 100 mil. Valores sempre vinculados ao
desempenho do profissional em angariar fieis.
As
"comissões", no entender da fiscalização, não configuram ajuda para
subsistência; por isso, religiosos passaram a ser atuados.
O jabuti colocado
na MP amplia o conceito de ajuda de custo ao dizer que as condições descritas
na lei atual são "exemplificativas" e não "taxativas". Ou
seja, o dinheiro não precisa ser exclusivamente para subsistência e pode ser
vinculado ao desempenho do pastor.
O texto também
deixa claro que valores pagos aos religiosos como "ajuda de custo",
ainda que em "montantes diferenciados", não constituem remuneração.
Cunha, que era da
Igreja Sara Nossa Terra e hoje pertence à Assembleia de Deus, afirmou que o
artigo não cria uma regra nova. "Apenas esclarece a regra antiga, porque
do jeito que estava, dava desculpa para lavrar auto de infração contra as
igrejas.''
Segundo a Folha
apurou, uma das principais beneficiárias da medida seria a Igreja Internacional
da Graça de Deus, do missionário R.R. Soares, multada em cerca de R$ 60 milhões
em 2014.
Membros da
bancada evangélica dizem que não há modificação na lei, que já prevê
imunidades, e que o artigo foi acordado com o governo, com o conhecimento de
Dilma.
Os pastores Silas
Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, e Robson Rodovalho, da Sara
Nossa Terra, participaram da articulação com o vice-presidente Michel Temer
(PMDB) sobre a inclusão do artigo. A Receita Federal
não quis se manifestar.
OUTRO LADO
As igrejas e seus
aliados no Congresso Nacional afirmam que a emenda aprovada, que pode garantir
a anulação de autuações fiscais a igrejas, não traz nenhum benefício novo,
apenas regulariza e deixa mais clara a legislação hoje vigente sobre o tema,
evitando autuações da Receita Federal, hoje na ordem dos milhões.
Presidente da
Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que acolheu o pedido das igrejas
para incluir a emenda em votação de uma medida provisória do ajuste fiscal, diz
que "não se cria uma regra nova, apenas esclarece regra antiga porque, do
jeito que estava se fazendo, estava dando desculpa para lavrar auto de infração
contra as igrejas''.
O presidente da
Igreja Sara Nossa Terra, bispo Robson Rodovalho, vai na mesma linha de Cunha.
"Foi uma
iniciativa muito importante porque trouxe à luz uma zona cinzenta que havia na
tributação", afirmou o bispo.
"As igrejas
têm assegurada sua imunidade tributária pela Constituição, mas faltava uma
regulamentação, o que agora foi suprido com a medida", acrescentou.
Procurada, a
Igreja Internacional da Graça de Deus não se manifestou até a conclusão desta
edição.