No
Espírito Santo, um advogado foi preso pela segunda vez, sem ser
investigado, por ter desobedecido a restrições que não lhe foram
impostas. Ao decretar a prisão, o juiz invocou ainda uma motivação que
já fora afastada anteriormente. Essa é a delicada situação de Carlos
Itamar Coelho Pimenta.
O caso se deu no desenrolar na investigação
de desvio de recursos da Igreja Cristã Maranata. Como Pimenta é, ao
mesmo tempo, pastor e advogado da instituição, entendeu-se que haveria
uma espécie de incompatibilidade — como se um clube, o Corinthians , por exemplo, fosse proibido de contratar advogados corintianos.
A
prisão foi mantida no Tribunal de Justiça do Espírito Santo em razão da
“gravidade das acusações”. No Superior Tribunal de Justiça, o ministro
Gilson Dipp negou o Habeas Corpus também baseado na “gravidade” das
imputações. Já no Supremo Tribunal Federal, o presidente da corte,
ministro Joaquim Barbosa, considerou não existir urgência no caso do réu
preso. O caso agora aguarda no Supremo posicionamento do ministro
Ricardo Lewandowski, relator do Habeas Corpus.
A história teve
início há cerca de três anos, quando a direção da igreja certificou-se
que, com a conivência do contador e do vice-presidente, ocorreram
desvios de recursos da Maranata. Ambos foram afastados.
Um outro
acusado, o ex-pastor Mario Moraes, que criou nova igreja para si,
resolveu partir para o ataque, afirmando que os desvios foram maiores do
que os apurados pela Igreja Maranata.
Diante das acusações do
ex-pastor, o Ministério Público deu início a um Procedimento
Investigativo Criminal, do qual o advogado Carlos Pimenta não era alvo.
Esta investigação resultou na prisão de cerca de dez integrantes da
igreja, inclusive do seu presidente, que foi quem determinou o inquérito
interno. Embora seja réu no caso, o ex-pastor Mario Moraes virou uma
espécie de assistente da acusação e está solto.
No curso da
história, cheia de ordens e contra-ordens, o advogado Carlos Pimenta foi
preso em março deste ano por suposta coação de testemunhas. Porém, doze
dias depois, a Justiça revogou a prisão alegando que era desnecessária e
não havia risco processual.
Na visão do Ministério Público, os
acusados fazem parte de uma organização criminosa que se instalou na
direção da Igreja Maranata. De acordo com a denúncia houve formação de
quadrilha, estelionato, apropriação indébita e outros crimes.
Os
promotores ainda argumentam que a prisão era necessária porque a Igreja
Cristã Maranata teria influência política. Segundo o MP-ES, a igreja
“atrelou suas atividades religiosas ao apoio de proeminentes autoridades
da República, tornando-se muito próxima de expoentes figuras do cenário
político-jurídico, sendo que estes, beneficiaram-se, em certa medida,
dos fiéis com ‘capital político’ a fim de obtenção de êxito em prélios
eleitorais”.
No pedido de prisão formulado pelo MP-ES, apesar de
ser afirmado que o advogado Carlos Pimenta deveria ser processado por
ter contrato com a igreja, não há qualquer explicação sobre o que ele
teria
feito para ter sua prisão decretada.
Mesmo assim, o juiz
Ivan Costa Freitas, da 8ª Vara Criminal de Vitória teceu argumentos —
que não estavam no pedido de prisão —, alegando que o advogado deveria
responder ao processo na prisão, como “garantia da ordem pública” e da
“instrução processual”. O juiz utilizou ainda o mesmo argumento de
coação de testemunhas, que já não era válido de acordo com a decisão que
revogou a prisão do advogado três meses antes.
Os advogados de Carlos Pimenta — Fabrício Campos, Conceição Aparecida Giori e Joaquim Pedro de Medeiros Rodrigues, do escritório Oliveira Campos & Giori Advogados — ingressaram com pedido de Habeas Corpus, negado pelo TJ-ES.
Os
advogados argumentaram que a prisão é ilegal por diversos motivos.
Entre eles, a gravidade abstrata do delito, que o decreto criou fatos
inexistentes e que não foi respeitada a obrigatoriedade do contraditório
prévio.
“A prisão preventiva não afirma nenhum fato, acresce
elementos sequer apontados no pedido do Ministério Público e não
esclarece ao certo os motivos da custódia cautelar”, afirmam no pedido
de HC.
Os mesmo argumentos foram levados ao STJ, que também negou o
pedido. O ministro Gilson Dipp, afirmou, genericamente, que o relator
do HC no Tribunal de Justiça do Espírito Santo reconheceu “a gravidade
dos fatos” imputados. Na decisão, o Dipp afirma que “não cabe Habeas
Corpus contra indeferimento de liminar, a não ser em casos de evidente e
flagrante ilegalidade, sob pena de indevida supressão de instância”.
Os advogados então recorreram ao Supremo e o pedido agora aguarda decisão do ministro Ricardo Lewandowski, relator do HC.
De
acordo com os defensores, tem chamado a atenção de modo negativo neste
caso é a suposta coação a testemunhas. “Explicamos nas diversas
impetrações que esse assunto havia sido objeto de prisão preventiva e
essa mesma prisão havia sido revogada pelo juiz da Vara Central de
Inquéritos”.
Por isso, explicam, essa motivação não poderia ser
repetida agora, meses depois da soltura, pelo juiz que recebeu a
denúncia. “Os outros fundamentos também são incoerentes com as decisões
judiciais proferidas na época da investigação: na nova prisão fala-se em
violação de medidas cautelares que nunca foram decretadas contra o
paciente, o que é muito grave, pois temos um advogado preso por violar
uma proibição judicial que não existia”, complementam.