A
denúncia criminal deve ser individualizada, com a descrição dos crimes
cometidos por cada um dos acusados, ainda que eles sejam 70. Caso
contrário, trata-se da “arbitrariedade” de “se processar uma gama
aleatória de pessoas sem especificar as ações que cada um tenha,
efetivamente, realizado”. A argumentação foi usada pelo juiz Antonio
Carlos de Campos Machado Junior, da 19ª Vara Criminal de São Paulo, para
rejeitar a denúncia
feita pelo Ministério Público estadual contra os 70 estudantes da USP
que ocuparam a reitoria da universidade, em novembro de 2011.
Os
estudantes ocuparam o prédio da reitoria em protesto contra um plano de
segurança que previa a presença da Polícia Militar no campus da
universidade, em São Paulo. Foram denunciados, já em 2011 pelos crimes
de destruição de patrimônio público, fabricação de explosivos, formação
de quadrilha e por terem pichado as instalações da reitoria. Só que a
denúncia, feita pelo MP poucas semanas depois da invasão, não
individualizou as acusações. A Promotoria tratou os 70 como se todos
eles tivessem cometido todos os crimes. Do grupo inteiro, cerca de 40
foram defendidos pelo advogado Alexandre Pacheco Martins, do Braga Martins Advogados.
Isso
foi suficiente para que o juiz rejeitasse a denúncia. “O direito penal,
exceto nos regimes de exceção, não compactua com acusações genéricas,
que acabam por inviabilizar, muitas vezes, o pleno exercício do direito
de defesa”, escreveu. O juiz explicou que cada denunciado precisa saber
do que é acusado, justamente para poder se defender e argumentar se os
tipos penais discutidos foram de fato cometidos. Como a acusação fala
genericamente de todos os estudantes, esse exercício da defesa não
poderia ser feito.
O juiz Campos Machado ponderou que, de acordo
com o que foi noticiado pela imprensa, os estudantes se excederam em
suas manifestações. Houve relatos, em juízo, de depredações ao prédio da
reitoria e a um carro da Polícia Militar. Mas “afirmar, com respeito a
setenta réus, que todos praticaram ou aderiram a conduta dos que
depredaram as viaturas policiais, ou guardavam artefatos explosivos e
bombas caseiras, recai no campo das ilações, por quem ignora ou não mais
se lembra da sistemática de funcionamento das manifestações
estudantis”, sentenciou.
E finalizou: “Prova maior do exagero e
sanha punitiva que se entrevê na denúncia é a imputação do crime de
quadrilha, como se os setenta estudantes em questão tivessem-se
associado, de maneira estável e permanente, para praticarem crimes,
quando à evidência sua reunião foi ocasional, informal e pontual, em um
contexto crítico bem definido”.
Inquérito 0023563-10.2011.8.26.0011
Fonte: Conjur