O ex-procurador-geral e membro da Comissão Nacional da Verdade,
Claudio Fonteles, divulgou nesta quinta-feira, dia 9, seis textos
relativos à pesquisa documental que tem feito no acervo do Arquivo
Nacional nos documentos do extinto Serviço Nacional de Informações
(SNI). Entre as informações divulgadas, as "Informações 141 e 142"
produzidas pelo Centro de Centro de Informações de Segurança da
Aeronáutica (Cisa) apontam que os desaparecidos políticos Fernando Santa
Cruz de Oliveira e Eduardo Collier foram presos por agentes da
Aeronáutica e não do DOI-Codi/RJ.
"Tem-se pois que no dia 16 de fevereiro de 1974, os agentes da Cisa,
que acompanhavam pari passu, a movimentação de Collier e Santa Cruz, os
observaram em encontro em restaurante ao lado do cine Paissandu",
escreveu Fonteles, ao citar o relatório número 142 do Cisa que continha
relatos de perseguição a Santa Cruz.
"Fica claro pela documentação que o Cisa estava no encalço. O Cisa
tinha toda a manobra sobre os dois", apontou o membro da CNV.
Fernando Santa Cruz desapareceu em 23 de fevereiro de 1974, em
Copacabana, no Rio de Janeiro, junto com Eduardo Collier Filho. Até o
momento, acreditava-se que os dois tinham sido presos por agentes do
DOI/Codi do Rio. Para Fonteles, no entanto, não há dúvidas de que a
prisão, tortura e morte dos dois militantes do Ação Popular
Marxista-Leninista (AMPL) foi realizada por militares da Aeronáutica.
"Não resta a menor dúvida de que Collier e Santa Cruz foram presos por
agentes do Centro de Inteligência da Aeronáutica (Cisa). Depois,
torturados e mortos", informou Fonteles.
Em depoimento ao livro Memórias de uma Guerra Suja, o
ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) Cláudio
Guerra disse que os corpos de Collier e Santa Cruz foram queimados na
Usina Cambahyba, em Campos (RJ). Fernando Santa Cruz de Oliveira é pai
do presidente da OAB do Rio, Felipe Santa Cruz Oliveira.
Araguaia
Além dos casos de Santa Cruz e Collier, o bloco publicado hoje possui
textos sobre o Araguaia. Em dois capítulos, Fonteles analisa vários
relatórios do Exército e da Marinha, que relatam os "avanços" na
campanha de extermínio da guerrilha do PC do B no ano de 1972. No
primeiro, os documentos do Exército demonstram o uso de força
desproporcional na tarefa. O governo chegou a movimentar 2.453 homens na
área e envolveu 1.957 deles nas operações contra cerca de 65
guerrilheiros.
De acordo com um relatório em novembro de 1972 do tenente-coronel
Flarys Guedes Henriques de Araújo, em pelo menos três bombardeios o
Exército fez uso de napalm. "As missões pretendidas pelo CMP aqui
mencionadas no item 1 foram executadas no decorrer das operações; há a
acrescentar àquele repertório o bombardeio de três áreas com bombas
napalm e de emprego geral", informou o relatório.
"Há a compravação do uso uso de napalm em três operações. Uma coisa terrível", afirmou Fonteles.
Em dado momento os documentos informam que a repressão compara a ação
de eliminação de guerrilheiros a um exercício: "A manobra, como
exercício de adestramento da tropa, alcançou plenamente seu objetivo".
"Vidas humanas são ceifadas como mero ´exercício de adestramento´ de
tropas militares", comenta Fonteles. Os documentos deixam claro a
participação ativa do Estado Maior do Exército e do Comando Militar do
Planalto nas decisões.
Riocentro
Fonteles ainda escreveu uma análise do acervo do caso Riocentro,
encontrado na casa do coronel Júlio Miguel Molinas Dias, assassinado no
Rio Grande do Sul, e entregues por sua família à polícia local. Os
documentos de Molinas sobre o caso Riocentro trazem anotações detalhadas
sobre as atividades que ele, como comandante do Doi-Codi do Rio, tomou
sobre o caso. Na capa, ele informa que seu relatório foi entregue ao
coronel Leo Frederico Cinelli, seu superior hierárquico, chefe do
serviço de inteligência do 1º Exército, em 08 de maio de 1981, nove dias
após a explosão.
Os apontamentos indicam, na avaliação de Fonteles, que o Exército
tentou manipular o caso, mas sem sucesso, pois a explosão do artefato
portado pelo sargento do Exército Guilherme Ferreira do Rosário, morto
no acidente, ocorreu sem nenhuma intervenção externa, numa provável
imperícia do agente da repressão, classificado nos apontamentos como um
"técnico em explosivos autodidata, sem curso ou estágio no manuseio de
explosivos".
Fonte: site do jornal O Globo